Segunda-feira, Fevereiro 12

Segunda-feira, Fevereiro 12

FIM


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Foi a nossa modesta contribuição para a vitória do "sim".

Viva a dissolução dos costumes


Sim, tem toda a razão quem acha que este foi só o princípio da dissolução dos costumes. Antes de mais, do costume que o Estado tem de enfiar o bedelho na vida privada de cada um. Depois, do costume que a Igreja tem de fazer da lei da República arma de evangelização do próximo. Ainda, do costume de poucos se acharem no direito de ter alguma coisa a dizer sobre a forma como os demais vivem. Também do costume de tratar a mulher como um ser infantil e incapaz de gerir a sua própria vida. Por fim, do costume de termos leis que ninguém tenciona cumprir e do costume de todos acharem que isso é perfeitamente normal. E à dissolução de tão maus costumes, eu digo viva.

Acordar


com a sensação de que a longa noite obscurantista chegou ao fim.

Responsabilidades


O Sim ganhou. O país ganhou. O Estado secular ganhou. Agora é tempo de tornar o aborto mais raro, precoce e seguro, acabar com a liberalização de vão de escada. É tempo de despenalizar.

Domingo, Fevereiro 11

Domingo, Fevereiro 11

Parabéns a todos


Calhou. Aqui há uns anos, aquando da viagem do famoso barco do aborto até às proximidades da nossa costa, apareci na televisão a dar a cara para defender a despenalização. Essa passagem televisiva, ainda que efémera, operou um efeito interessante no meu círculo de relações: uma espécie de mediatismo de proximidade. Dei por mim a ser abordado por pessoas amigas, conhecidas e vagamente conhecidas: queriam-me contar as suas experiências com a questão do aborto (clandestino, entenda-se). O mais curioso, sem dúvida, foram os testemunhos de mulheres mais velhas -- aquelas figuras maternais que orlam à minha volta desde a infância --, mulheres que, por qualquer preconceito, imaginava biograficamente afastadas destas questões.

Saber que nas suas juventudes ou em algum momento das suas vidas tinham recorrido ao aborto foi para mim chapada sociológica: tal é a dimensão do fenómeno do aborto clandestino que necessariamente toca pessoas que nos são próximas.
Imaginem então, por ter aparecido uns segundos na televisão a brandir a mudança da lei, fui feito confidente de histórias raramente contadas. Qual inesperada elicitação antropológica, foi o insólito meio para aceder a algo dos dramas por que passaram gerações e gerações de mulheres em Portugal. São mulheres que amiúde ficam caladas quando se fala publicamente em aborto, talvez querendo afastar das bocas de todos a má memória de uma dor tão privada. Para elas, este dia, onze de Fevereiro de dois mil e sete , chega tarde, mas chega. As memórias de sofrimento são mais suportáveis quando socialmente as podemos partilhar como injustas. A minha homenagem a todas essas mulheres, para as que doravante não mais terão que passar pelo aborto clandestino. Parabéns a todos nós.

(recolher)

S I M


A maior vitória de hoje é acreditar que, com este resultado, vai ser possível devolver este assunto à consciência individual de cada um.

O problema de não saber perder


Eu sei que a derrota custa muito, mas nada justifica que a Mafalda, do BdN, tenha escrito o post mais infame, mentiroso e desonesto de que tenho memória.


59,25


Eu só pedia uma vitória clara, mas 59,25% (2.238.053 votos) é mais do que uma vitória clara. É a prova de que o eleitorado amadureceu desde 1998 e se sintonizou com os valores da modernidade europeia. Agora é imperioso legislar o mais rapidamente possível para acabar, de vez, com o mercado abjecto do aborto clandestino.
Parabéns, eleitores portugueses. Emendámos hoje, com dignidade, o desastre de há nove anos.

Com outros olhos


Havia muito boas razões para o fazer. Mas o que realmente me decidiu a participar nesta campanha foi o olhar espantado, sinceramente perplexo, pedindo explicações, das minhas alunas franco-portuguesas em relação à situação da interrupção voluntária da gravidez em Portugal. Eu tinha-lhes falado nas aulas do sistema político e constitucional português (incluindo a figura do referendo). Num momento mais avançado do semestre, falei-lhes da situação social no pós 25 de Abril e insisti, apoiando-me em números, na enorme evolução da situação das mulheres em Portugal, em termos de escolarização e acesso à universidade e em termos da participação no mercado de trabalho. Mas, apesar das estatísticas, tinha ficado ali, pelo menos no meu íntimo, um nó cego, uma contradição inexplicável entre indicadores sociais "progressistas", comparáveis aos dos países escandinavos em certos aspectos, e a persistência do aborto clandestino e de uma lei que criminalizava as mulheres. Uma contradição que nenhuma explicação sociológica, ou antropológica, ou outra qualquer, conseguia resolver. E talvez fosse isso que se reflectia, penso agora retrospectivamente, no tal olhar espantado das minhas alunas.

Agora a contradição, pelo menos esta, começou a ser resolvida. É altura de passar a encarar os olhos das minhas alunas com outros olhos.

Finalmente!


FOI DESTA!

PARABÉNS!!!


Acabou Badajoz, bem-vindos ao século XXI!

Tiago Barbosa Ribeiro

Portugal entra no Séc. XXI


Aqueles que têm uma visão confessional do direito e acham que as penas servem para impor as suas convicções morais sofreram hoje um duro golpe.

Por um lado, as pessoas sentem-se hoje mais capazes de tomar posição sobre a despenalização da IVG e, por outro lado, pronunciaram-se com uma maioria muito clara a favor do "Sim".

Vamos legislar!



Sexta-feira, Fevereiro 9

Sexta-feira, Fevereiro 9

Vota Sim

A campanha chega agora ao fim. O Sim no Referendo respeita, naturalmente, o dia de reflexão. Assim, este é o nosso último post até Domingo, depois de se começarem a saber os resultados da votação. Neste blogue, criado excepcionalmente para um momento excepcional, composto por pessoas (de início 14, no meio e no fim 36) muito diferentes entre si e nas suas posições, apresentámos argumentos em favor do Sim no referendo do próximo Domingo. Partimos de um mínimo denominador comum — o voto Sim — e, dizemos-vos, não sem orgulho, chegámos ao máximo denominador de cumplicidade e partilha: o blogue superou todas as nossas expectativas em termos de militância, espírito de entreajuda e coerência. Achamos que isso só se pode dever à enorme convicção que nos une em torno desta causa.

Esperamos ter contribuído para a discussão, para a informação dos leitores (cerca de 3000 visitas diárias, segundo o Sitemeter) e, claro está, para a vitória do Sim. Os argumentos estão aí, na sua diversidade, para quem os quiser consultar, no arquivo do blogue. Neste último post, assinado por todos nós, queremos apenas lembrar uma última vez que há muitas e boas motivações para responder afirmativamente a esta pergunta: «Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?»

Votar Sim é viabilizar uma lei moderada, com um prazo definido e curto, que deixará de tratar como criminosas as mulheres que tiverem de recorrer a uma interrupção voluntária da gravidez. A criminalização dessas mulheres e de quem as acompanhou nesse acto conduz em linha recta, como se viu nos últimos anos, à devassa judicial da sua intimidade e da sua dor. Essa devassa não é uma mera excrescência da lei actual ou algo que possa ser reduzido a golpes de intenções piedosas feitas em campanha eleitoral. Ela está inscrita na lógica da penalização.

Votar Sim é contribuir para acabar com a pena social e moral que as mulheres também pagam, sempre pagaram, no recurso ao aborto clandestino. É contribuir para terminar com o estigma social que a clandestinidade traz sempre consigo e que agrava, de forma perversa, a culpabilidade e o sofrimento de quem tem que abortar.

Votar Sim é dar o primeiro, o único passo para eliminar ou reduzir drasticamente o aborto clandestino em Portugal. O "estabelecimento de saúde legalmente autorizado" da pergunta representa essa enorme vitória para a saúde pública. Tanto mais que a clandestinidade traz consigo uma insuportável desigualdade social. Como toda a gente neste país sabe, quem pode vai a Espanha ou paga uma intervenção segura. Quem não pode, fica reduzido à agulha de tricot ou aos seus substitutos modernos. Votar Sim não é acabar com o aborto, mas é pôr fim a muitos problemas de saúde e mortes de mulheres por aborto.

Votar Sim é fazer entrar em ambiente hospitalar as mulheres que se deparam com uma gravidez indesejada. É contribuir para diminuir a sua ansiedade, para possibilitar a decisão informada e o conhecimento de alternativas e apoios. Votar Sim não é garantir a diminuição do aborto, mas pode ser um primeiro passo nesse sentido, como mostram vários exemplos na Europa que adoptaram disposições semelhantes à que agora se propõe. Votar Sim é fazer um um apelo ao legislador para que, na nova lei, siga esses bons exemplos, e é dar um voto de confiança às mulheres e ao país.

Votar Sim é constatar e aceitar que, em última análise, a decisão de abortar recai sempre sobre a mulher. Tal não quer dizer que ela a tome sempre sozinha, mas quer dizer que ela a toma mesmo em condições extremamente adversas, incluindo a de saber, como sabe hoje, que à face da lei o seu acto será um crime. Votar Sim, no entanto, não obriga nenhuma mulher a abortar. O voto Sim é o único voto que respeita os valores mais íntimos de cada pessoa, incluindo, como é evidente, a liberdade — que nunca deixará de ser a regra na nossa sociedade — de levar uma gravidez ao seu termo. O voto Sim é o único voto que faz com que o Estado deixe de interferir numa esfera que é do domínio pessoal e privado.

Nada disto aconteceria se o Não ganhasse. Votar Não é deixar tudo como está. Apesar das crescentes contradições do Não ao longo da campanha, apesar das tentativas para deliberadamente confundir os eleitores, a escolha é clara: vota "sim" quem concorda com a despenalização do aborto, se feito por opção da mulher, em estabelecimento de saúde legal. Vota "não" quem discorda. Da vitória do "sim" resultará uma lei que despenalizará. Da vitória do "não" resultará a manutenção da lei actual.

Quem quer mudar uma lei que é injusta, que humilha, julga e condena, só pode votar Sim. Quem quer mudar uma lei que não é aplicada nem dissuade um só aborto, só pode votar Sim.

Fundamentos extraordinários

Nesta campanha, nos vários debates em que estive, o "Não" repetiu sempre um argumento notável: deve ser negada a possibilidade de escolha das mulheres em fazer a IVG para dar lugar ao planeamento familiar e a políticas públicas de esclarecimento e aconselhamento familiar e sexual (como se ambas as coisas fossem incompatíveis em algum lugar com que nos gostamos de comparar …). E, normalmente, quase todos os circunstantes abanavam gravemente a cabeça, concordando.
E eu, sorrindo, recordava a batalha enorme que o
Dr. Albino Aroso teve de travar há alguns anos para realizar em Portugal alguma coisa que se assemelhasse a "planeamento familiar".
« Pílulas?», diziam. Dar «preservativos à toa?», assustavam-se. E a «moral?», perguntavam. Isso vai destruir a « família», avisavam. «Educação sexual?», indignavam-se. Isso seria ensinar os nossos filhos a saberem « o que não devem fazer», sentenciavam.
E, agora, os mesmos, precisamente os mesmos, aqueles que andaram durante décadas a rugir contra os métodos contraceptivos e a educação sexual, chegam a este momento eleitoral ancorando quase toda a argumentação pública do "Não" naquilo que condenaram durante todo o tempo anterior. Agitam todo o acervo de razões que estigmatizam desde há décadas e que boicotaram sempre que lhes foi possível - « Ter um filho é um acto moral. Engravidar não pode ser um mero acidente », garantem alguns cheios de verdade na sua mão direita.
Mas, enfim, a coerência e a realidade nunca foram óbice bastante para os que se julgam os únicos defensores dos valores e dos princípios à face da terra e dos céus...

Uma pergunta directa para uma resposta honesta

Rui Tavares
(do Público de 3 Fevereiro)

Dizer que é "despenalização da IVG" significa que não é despenalização de qualquer outra coisa, dizer que é "por opção da mulher" significa que não é por opção de qualquer outra pessoa, dizer que é até "às dez semanas" significa que não é sem qualquer limite, dizer que é "em estabelecimento de saúde" significa que não é no meio da rua.

A pergunta a que vamos responder no referendo do próximo dia 11 é compreensível para qualquer pessoa que saiba ler e isso é algo que nenhum contorcionismo político ou gramatical poderá mudar.



"Concorda com a despenalização...". A despenalização é, evidentemente, a palavra-chave desta pergunta. É talvez surpreendente, mas o referendo de próximo dia 11 não é acerca de quem gosta mais de bebés

, tal como não é acerca de quem mais respeita o sofrimento das mulheres. A pergunta do referendo também não é "dê, por obséquio, o seu palpite acerca de quando é que a alma entra no corpo dos seres humanos", matéria que sempre intrigou os teólogos. Não é acerca de quem gosta de fazer abortos e quem gosta de dar crianças para orfanatos. Por isso e acima de tudo, devo confessar que sofro de cada vez que ouço na televisão jornalistas falarem dos dois campos em debate como o "sim ao aborto" e o "não ao aborto".
Numa pergunta que começa com aquele "concorda com a despenalização", os dois votos possíveis não se dividem em pró-aborto e anti-aborto, e muito menos pró-escolha e pró-vida. Os que respondem "Sim" à pergunta são "pró-despenalização". Os que respondem "Não" são "pró-penalização" (ou "anti-despenalização", o que é forçosamente ser a favor da penalização). Tudo o mais é responder com alhos a uma pergunta sobre bugalhos, e qualquer chefe de redacção deveria saber isso.

"...da interrupção voluntária da gravidez...". Até agora sabemos que a pergunta é sobre despenalizar, mas ainda não falámos de quê. Há quem tenha problemas com a expressão "interrupção voluntária da gravidez" por considerá-la um eufemismo, mas acontece que é a fórmula correcta para designar um aborto não-natural, não-espontâneo. Mesmo assim, isto não atrapalha o debate: toda a gente parte do princípio de que IVG é aquilo que, em linguagem corrente, genérica e imprecisa, chamamos de aborto. Os problemas surgem quando nos aproximamos da segunda parte da pergunta.

"...se realizada, por opção da mulher". No mundo real, o que quer dizer esta parte da pergunta? Quer dizer que a concordância com a despenalização da IVG deve ser dada (apenas e só) no pressuposto de que ela seria realizada por opção da mulher. Basicamente, significa que se uma mulher for forçada a abortar por uma terceira pessoa, esse aborto é crime e essa tal terceira pessoa será punida. Quer dizer que, se fulano apanhar uma mulher grávida, a anestesiar e lhe interromper a gravidez, não poderá eximir-se respondendo que "o aborto foi despenalizado", precisamente porque graças à segunda parte da pergunta o aborto só é despenalizado se for por opção da mulher.
No mundo do "Não", porém, esta parte da pergunta é a que causa mais engulhos. Percebe-se porquê. "Por opção da mulher"? A mulher, grávida de poucas semanas, a tomar uma decisão? Sozinha? Deve haver aqui qualquer coisa de errado. Quando se lhes retorque que não poderia ser por opção de outra pessoa, e se lhes pergunta quem queriam então que fosse, a informação não é computada. Algures, de alguma forma, teria de haver alguém mais habilitado para tomar a decisão. O pai? O médico? O Estado? Então e se qualquer deles achasse que a mulher deveria abortar, contra a vontade desta? Pois é. É precisamente por isso que aquele inquietante "por opção da mulher" ali está.

"...nas primeiras dez semanas...". Aborto livre, grita o "não"! Aqui está a prova, o aborto é livre até às dez semanas! Ora, meus caros amigos, o limite de dez semanas significa precisamente que o aborto não é livre... Ou o facto de só se poder andar até cinquenta quilómetros por hora dentro de uma localidade significa "velocidade livre"? Não faz muito sentido, não é verdade?
Enquanto digerem esta pergunta, os adeptos do "Não" mudam de estratégia. Então o que acontece às onze semanas? E o que acontece, meus amigos, quando se anda em excesso de velocidade? É-se penalizado, e a penalização vai se agravando quanto maior for o excesso de velocidade. Isso quer dizer que, nos pressupostos da pergunta, o aborto não é livre. Não era esse o problema?

"...em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?" Esta parte final é tão clara que vou poupar palavras. Um "estabelecimento de saúde" quer dizer que não é um estabelecimento desportivo, e "legalmente autorizado" quer dizer que não é ilegal, ou que não é legalmente desautorizado, se tal coisa existisse. Mas vale a pena notar o que "legalmente autorizado" não quer dizer. Não quer obrigatoriamente dizer do Estado, mas também não quer dizer privado, particular, ou o que seja. Quer dizer apenas que é num estabelecimento de saúde conforme com os procedimentos legais e que foi expressamente autorizado para a operação em causa.

Não há melhor barómetro da má-fé neste debate do que dizer que estamos em face de duas perguntas diferentes, ou até duas perguntas de sinal contrário (uma legítima, a outra capciosa), tentando fazer passar a ideia de que a "segunda pergunta" de alguma forma perverte a primeira, rompendo com ela. Não há aqui primeira nem segunda pergunta: há apenas uma pergunta, que se refere a determinadas condições, condições essas que qualificam e restringem o âmbito da questão. Dizer o contrário disto não é só má-fé, é principalmente má-lógica: se a segunda metade da pergunta está contida na primeira ela não pode ser mais aberta do que a anterior. Como é natural e faz sentido, cada passo da pergunta a fecha um pouco. Dizer que é "despenalização da IVG" significa que não é despenalização de qualquer outra coisa, dizer que é "por opção da mulher" significa que não é por opção de qualquer outra pessoa, dizer que é até "às dez semanas" significa que não é sem qualquer limite, dizer que é "em estabelecimento de saúde" significa que não é no meio da rua, e dizer que a pergunta se refere a um estabelecimento de saúde "legalmente autorizado" significa que não pode ser no dentista, ou na farmácia, ou no ginásio.

Tudo o resto é apenas uma desculpa para não se assumir as responsabilidades do voto.
Pessoalmente, não vejo nesta pergunta nada que não me agrade, e vejo muita coisa que me agrada. É uma pergunta de compromisso, cautelosa, que prevê os limites mais importantes, deixando a definição das políticas (de saúde, de planeamento familiar, judicial, etc.) para os actores e momentos certos. Pode responder-se sim ou não, e eu responderei "Sim". Sou pela despenalização, naquelas condições, como outros são pela penalização mesmo naquelas condições. O que não se pode é invalidar a pergunta, degradando a sua lógica. Trata-se de uma pergunta directa. Como tal, pede apenas uma resposta honesta.


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Abstencionista à força

Pela primeira vez na minha vida, não vou participar num acto eleitoral.
Eu que votei sempre, mesmo nas presidenciais com resultado conhecido à partida, eu que nunca abdico do meu direito cívico, estejam em causa autárquicas, legislativas ou europeias, eu que cheguei a percorrer quilómetros e quilómetros para deixar o boletim preenchido na urna, feliz por fazer parte do processo democrático, eu que neste aspecto (pelo menos neste aspecto) me considero um cidadão que cumpre o seu papel, eu não vou poder votar no referendo de domingo.
E porquê? Porque não estou em Portugal. Porque estou em Berlim, ao serviço do diário em que trabalho. E porque a legislação em vigor não permite, no meu caso, o recurso ao voto antecipado. O voto antecipado que a mesma lei me asseguraria se eu fosse:

- Militar ou agente de uma força de Segurança Interna

- Trabalhador marítimo, aeronáutico, ferroviário ou rodoviário de longo curso

- Membro de uma selecção nacional ligada a uma Federação desportiva

- Doente internado em estabelecimento hospitalar

- Preso que não esteja privado de direitos políticos



Mas contemos melhor esta história, já que ela merece ser contada. Há umas semanas, logo que soube que a Berlinale coincidiria com o Referendo, dirigi-me à Junta de Freguesia da minha residência e pedi informações sobre os procedimentos relativos ao voto antecipado. No folheto que me entregaram, estava tudo muito bem explicadinho, com diagramas e bonecos. Era só fazer o pedido por escrito, provar o impedimento e preencher o boletim na presença do Presidente da Câmara, que o enviaria depois, dentro de um envelope azul lacrado, para a mesa da minha assembleia de voto.
O meu entusiasmo, porém, depressa esmoreceu. Com um sorriso amarelo, a funcionária da Junta de Freguesia mostrou-me a lista das pessoas que podem realmente antecipar o voto. A lista que já coloquei acima.
Indignado, perguntei se estavam a gozar comigo. Que sentido faz, num tempo em que tanto se teme a abstenção, desperdiçar o voto de um eleitor que até se dispõe a enfrentar toda a burocracia que lhe queiram impingir? E o que é que um jornalista (ou qualquer outro profissional que não se enquadre nos itens da tal lista) é menos do que um ferroviário, do que um camionista ou do que um condenado? Desde que devidamente justificada a minha ausência do país (em documento da entidade empregadora), por que carga de água não hei-de poder votar?
A funcionária, muito enfiada, só me respondeu: "Até pode ter razão, de facto, mas é assim que está na lei. Olhe, fale para o STAPE". E eu falei para o STAPE. Ao telefone, uma voz atenciosa mostrou-se solidária ("o meu marido está na mesma situação") mas não me pôde dar mais esperanças. "É uma injustiça, reconheço, mas a verdade é que a lei tem acrescentado novas categorias de forma muito lenta. No princípio, só podiam votar antecipadamente os doentes internados e os presos. Parte-se do princípio que este é um acto pessoal e presencial." Mas porquê os ferroviários e não eu?, insisti. "Corríamos o risco de ter pessoas de férias lá fora, porque é fácil arranjar uma justificação da entidade patronal." E depois?, apeteceu-me perguntar. Eram mais votos que se conseguiam e as pessoas deixariam de ter desculpas para abstenções fúteis. Apercebendo-me que esta era uma batalha perdida, limitei-me a questionar: "O que é que eu posso fazer para que isto mude e outros não passem pelo que eu estou a passar?" A resposta veio rápida: "Apele aos grupos parlamentares. Eles que mudem a lei."
Pois. Esperemos que a lei mude. Como está, não me deixa votar a mim, não deixa votar outras pessoas temporariamente deslocadas, não deixa votar os portugueses que vivem no estrangeiro. É assim mesmo. Não há volta a dar. Não há indignação que nos valha.
Também por isso, espero que o Sim vença folgadamente no domingo. Sentir que contribui, por causa do meu abstencionismo involuntário, para mais uma derrota num referendo tão crucial como este, seria um golpe demasiado duro para as minhas convicções democráticas.

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só o melhor possível

Domingo não vamos referendar o aborto.

A lei que temos já admite o aborto numa série de situações. Vamos apenas decidir se queremos acrescentar a esse elenco de excepções uma outra: a da interrupção da gravidez até às dez semanas por opção da mulher, num estabelecimento de saúde autorizado.

Votar Sim não é dizer que concordamos com o aborto, ou que achamos bem que se façam abortos, ou que nós próprios faríamos um aborto.

Votar Sim é dizer que sabemos que as mulheres e as raparigas portuguesas, quando engravidam sem querer e rejeitam essa gravidez, fazem abortos. Que os fazem e fizeram e farão, mesmo se ameaçadas de prisão e mesmo que saibam que correm risco de vida pelas condições em que muitos desses abortos são feitos. Gostaríamos que elas não engravidassem sem querer? Com certeza. Elas também. Gostaríamos que houvesse anti-concepcionais 100% eficazes? Claro, mas não há. Gostaríamos que as pessoas fossem 100% perfeitas? Evidentemente. Mas somos humanos, todos humanos.

A experiência dos países que despenalizaram a gravidez nas primeiras semanas de gestação diz, ao contrário do que tem sido propalado por uma campanha astuciosa, que despenalizar conduz a uma diminuição/estabilização dos número de abortos. Que a chantagem da vergonha e da prisão dá menos resultado que uma lei que permita às mulheres falar abertamento do assunto com um médico e reflectir com calma, sem a pressão da ilegalidade e do medo.

O Sim não promete um mundo perfeito. Só um mundo melhor. O melhor possível.

(publicado hoje no DN)

São Fulgêncio é pelo "Sim"

    "Mesmo as crianças que começaram a viver no ventre materno e morreram ou aquelas que, tendo acabado de nascer, passaram pelo mundo sem o sacramento do Santo Baptismo, serão punidas com a tortura do fogo eterno."
São Fulgêncio escreveu esta pérola no Séc. VI. A condenação do aborto, nas mentalidades retrógradas, que compreende a morte dos primogénitos do Egipto, mas não a história da "mulher adúltera", encontra esta explicação simples. A mulher grávida teve oportunidade já de conquistar a vida eterna. O feto, não. Só pode ser baptizado depois do nascimento. Por isso, até deveria dar-se prevalência à vida do feto em relação à vida da mulher grávida no caso de indicação terapêutica (saúde física ou psíquica da mãe em risco).

Deixo duas perguntas:

    • Compreendendo-se que São Fulgêncio pensasse assim no Séc. VI, como se entende que César das Neves, Mário Pinto e Bagão Félix digam o que dizem no Séc. XXI?

    • Se existe uma pessoa desde o momento da concepção, o que impede que o feto seja baptizado antes do nascimento?

Referendo - O que está em causa

Lígia Amâncio
(no Público de hoje)

Portugal é um país a muitas velocidades. Deram-se passos de gigante em certas áreas, é verdade, noutras parece que se avança a velocidade de caracol. De novo um referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez. Lá continuamos nesta saga que dura há 20, 30 anos. Passam as décadas, a sociedade muda, mas alguns argumentos continuam iguais.


Defende-se a lei vigente, uma lei que envergonha a democracia, porque não é para ser cumprida, e, no caso de o ser, a aplicação das penas que a mesma lei prevê suscita a indignação da opinião pública. Defende-se a lei vigente, ainda, em nome da pedagogia e contra a dita liberalização. O aborto existe em Portugal, e é um acto legal e autorizado muito para além das dez semanas, mas só se reclama a função pedagógica da lei, quando se trata de autorizar a IVG a pedido da mulher. Só nesse caso se receiam as filas intermináveis à porta dos hospitais, os serviços de urgência paralisados, os hospitais invadidos por multidões de mulheres que querem fazer abortos à custa dos nossos impostos. E se evoca a anomia que o levantamento do impedimento legal vai provocar, ao tornar possível interromper uma gravidez por dá cá aquela palha.
De quem se fala nestes argumentos? Quem são as pessoas aqui retratadas como seres perversos, fúteis, irracionais e desregrados, que só podem fazer parte da sociedade, se as suas decisões forem ponderadas por outros seres racionais e os seus comportamentos controlados pela lei disciplinadora? Pessoas que têm que viver sob tutela, cuja autodeterminação está subordinada ao superior direito à vida de um embrião. Pessoas cujos projectos de futuro têm de se submeter à ditadura do destino biológico, mas a quem se oferece uma ajuda caridosa ou uma piedosa reeducação, quando lhes toca essa infelicidade. Por estranho que pareça, no Portugal do século XXI, é de mulheres que se fala nestes argumentos.
O que está em causa neste referendo não é só acabar com os julgamentos infames, onde o princípio de julgamento justo está, à partida, posto em causa pela misoginia implícita na lei. No espaço público onde é derramada a vida íntima da acusada, na rua, na imprensa, ou na sala do tribunal, ela será sempre culpada de haver praticado o mal. O mal de não se ter resignado à sua condição de mãe biológica.
O que está em causa neste referendo é o reconhecimento de que as mulheres são seres autónomos e capazes de tomar decisões responsáveis e ponderadas. A vontade de lhes dar voz num assunto que lhes pertence e de respeitar a sua opinião. De proteger a sua saúde e a sua integridade física. O que está em causa são direitos humanos realmente universais. O que está em causa é uma nova lei que honre o Estado democrático e a dignidade das mulheres portuguesas.

Movimento Cidadania e Responsabilidade pelo Sim


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Carta a uma tia indecisa

Ana Bola nos Cromos da TSF de hoje.

Quanto mais falam...

Contributo de Vítor Dias

Como já foi notado, as principais forças, movimentos e personalidades defensoras do «não» no referendo de domingo decidiram arrancar convergentemente no ínicio da última semana de campanha não apenas insistindo em que seriam firmes opositores da penalização das mulheres que abortam mas também pondo a correr a ideia desavergonhada e mentirosa de que seria a vitória do «não» que permitiria que, a seguir, a despenalização se verificasse.


Foi neste quadro que subiram à boca de cena coisas tão díspares como as velhas e indecentes propostas de Bagão Félix para que as penas de prisão legalmente aplicáveis às mulheres fossem substituidas por trabalho comunitário (como forma de "expiação" da sua culpa, assim disse o próprio em 2002), como a confissão do crónico Daniel Serrão de que já ficaria satisfeito com um pedido de desculpas público por parte das mulheres que abortam fora do quadro legal, como ainda e sobretudo as múltiplas tentativas de revalorizar quer uma antiga proposta de Freitas do Amaral quer o projecto de lei apresentado por Rosário Carneiro e Teresa Venda, ambas deputadas independentes na bancada do PS.

No que toca a estas duas últimas propostas, e para que não haja confusões sobre alegadas convergências ou pontos de encontro entre os defensores do «sim» e do «não», importa sempre sublinhar que elas partem invariavelmente do sofisma que consiste em reduzir todo o problema em causa à possibilidade de julgamentos e condenações – na verdade, a única coisa que, por via dos telejornais, atrapalha e engasga alguns sectores do «não»- e sempre escamoteando que o problema de fundo é a existência do aborto clandestino – na verdade, algo que, por silencioso e pouco noticiável, jamais lhes tirou o sono ou sobressaltou a consciência.

Feita esta ressalva, e mesmo fazendo a concessão de examinar estas propostas no limitado âmbito em que se colocam, a verdade porém é que nem a antiga proposta de Freitas do Amaral nem o projecto de lei daquelas duas deputadas do PS assegura qualquer efectiva despenalização do aborto até às 10 semanas – prática que continuaria a ser considerada como «crime» no Código Penal, o que, só por si, representaria uma automática manutenção do dramático fenómeno do aborto clandestino.

Na medida em que já passaram três anos sobre a apresentação da proposta de Freitas do Amaral (artigo na Visão de 12-2-2004), importa relembrar que ela consistia fundamentalmente em aditar uma nova alínea ao artº 142º do Código Penal onde se consagraria que "a interrupção voluntária da gravidez, praticada a pedido da mulher grávida (...) e até às 12 semanas de gravidez , presumir-se-á ocorrida em estado de necessidade desculpante, com dispensa de pena, salvo se o Ministério Público apresentar prova concludente em contrário".

Face a esta aventada nova alínea, basta saber ler e pensar um pouco, não sendo necessário ser catedrático de direito nem sequer licenciado em tal área, para se concluir que, na melhor das hipóteses e contando com a nem sempre certa sensibilidade dos diversos magistrados envolvidos, ela apenas conduziria à não aplicação de uma pena mantendo entretanto os julgamentos, os processos, os interrogatórios, as investigações e até o andamento inicial das denúncias feitas por ajuste de contas ou vingança, ou seja, todas as fases ou actos processuais que, em casos como o da Maia ou de Aveiro, tanta celeuma, choque e indignação causaram.

Já quanto ao projecto de lei de Rosário Carneiro e Teresa Venda, que nem sequer altera uma vírgula ao Código Penal, adiante-se que, no essencial, vem dispor que, recebida notícia de crime de aborto, "o Ministério Público procede à sua inquirição" (logo da inquirição ninguém se livra!), estabelecendo depois que "não havendo motivo determinante do imediato arquivamento do processo, o Ministério Público ordena obrigatoriamente a suspensão provisória do processo [em regra durando dois anos], mediante a concordância da pessoa inquirida e se o facto tiver ocorrido nas primeiras 10 semanas de gravidez".

Este projecto prevê - e é essa a sua filosofia essencial – que à inquirida sejam impostos um conjunto de injunções e regras de conduta por parte do juiz de instrução e do Ministério Público podendo estes, para a respectiva vigilância do seu cumprimento, recorrer aos "serviços de reinserção social, a órgãos de polícia criminal e às autoridades administrativas". Por fim, resulta deste projecto que o cumprimento das regras de conduta leva ao arquivamento definitivo do processo e o seu incumprimento à sua continuação. Em declarações à SIC, a deputada Teresa Venda resumiu o projecto de que é co-subscritora afirmando que "a mulher não viria a ser julgada. O processo era aberto, analisadas as circunstâncias, sendo depois suspenso e a mulher encaminhada para a a segurança social para entrar num programa de formação profissional ou de planeamento familiar".

Podendo acontecer que uma descrição com tanto paleio jurídico acabe por resultar entorpecente, quero sublinhar com toda a clareza que toda esta proposta, tendo muitos dos aspectos já criticados na de Freitas do Amaral, me parece intolerável e chocante por tratar as mulheres que recorrem ao aborto clandestino quase como marginais ou semi-criminosas e como gente desorientada que precisa de ser acompanhada e vigiada durante dois anos ou objecto de medidas de reinserção social. A tal ponto que apetece afirmar que, em termos humanos, é menos humilhante enfrentar e cumprir uma pena de cadeia. Sendo caso para dizer que, quanto mais os defensores do «não» falam, melhor se percebe o mal que pensam.

A este respeito, fica-me a suspeita que há inteligências que são capazes de conceber projectos com este recorte mas, de certeza, não estão a pensar na sua aplicação às suas amigas da classe média que porventura tivessem recorrido ao aborto e, por azar, fossem apanhadas nas malhas policiais ou judiciais por efeito de denúncias ou investigações.

Tudo visto, haverá concerteza excepções, mas através de propostas como esta ficamos a saber que, do lado do «não», podem não faltar estudadas palavras de compaixão e compreensão pelas mulheres que abortam mas que isso é apenas a cortina protectora que esconde uma estrutura mental, uma ideologia e uma cultura que, de facto, as vê como seres levianos, imaturos e irresponsáveis.

E, em nome da indispensável mudança, é também esta concepção que importa derrotar depois de amanhã, votando «sim», sem falta!

(Texto de Vítor Dias publicado no Público, enviado como contributo para o blogue Sim no Referendo)

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o sim de adolfo mesquita nunes

Neste referendo sou chamado a contribuir para o sentido de uma lei de aplicação geral e universal. Sou chamado a orientar o legislador quanto ao que deve ser a enformação penal – e consequente regulamentação – do comportamento de uma mulher que aborta sem as motivações já previstas na lei.

A campanha começou, em coerência com as posições desde 1998, de forma mais ou menos clara. Do lado do "sim", pugnava-se pela despenalização, do lado do "não", pugnava-se pela manutenção inalterada da actual lei.

Claro que existem outras sensibilidades, de um lado e do outro. Não perderei tempo com elas. São os que rejeitam a existência de vida humana intra-uterina ou que a comparam, sem qualquer gradação à vida humana nascida. São os que vêem o Iraque e o Sudão e o Bagão Félix e o Código Laboral nesta questão ou os que denunciam a cultura da morte e do negócio e da decadência moral. Não perco tempo com elas porque se afastam do que penso. Respeito-as enquanto tal, nas nada tenho que ver com elas.

Perante este contexto, optei pelo voto "sim".


Sinto que a mulher não deve ser penalizada por esse gesto, o qual resultará na mais das vezes de um estado de necessidade ou de uma absoluta ausência da consciência da ilicitude. Falo aqui, reitero, de penalização estadual, com força de lei, e não da penalização pessoal e moral com que eventualmente encararei alguns desses actos.

E sinto que a lei de 1984 criou, de forma desnecessária, uma divisão entre abortamentos moralmente aceitáveis, onde se pressupõe a exclusão de culpa ou ilicitude, e abortamentos cuja aceitabilidade deve ser aferida processualmente e, eventualmente, em sede julgamento; divisão com a qual não concordo, por não lhe encontrar fundamento habilitante e legitimador.

Entretanto, o "não" veio colocar em cima da mesa a possibilidade de despenalização do abortamento, propondo uma espécie de compromisso entre o "sim" e o "não" moderados.

Passando ao lado das questões de oportunidade e constitucionalidade, que me interessam como jurista mas não como cidadão votante, fui obrigado a repensar a minha posição. Confrontado com esta nova ideia, tive de analisar as consequências do meu voto no "sim" ou no "não sob condição".

De um lado, a despenalização do abortamento, até às 10 semanas, por opção da mulher, se realizado em estabelecimento de saúde autorizado. Do outro, uma despenalização do abortamento, sem data limite ainda conhecida ou definida, sem a concretização das condições para a sua efectiva despenalização. De um lado e do outro, afinal, o que uns e outros negam. O espaço em aberto. A possibilidade discricionária do legislador.

Deste cotejo: um consenso. Despenalização sem descriminalização. Em qualquer uma das propostas, o abortamento mantém-se crime, algo com o que concordo.

A clivagem essencial parece estar, pois, na possibilidade de se legalizar a actividade ou negócio relacionado com o abortamento. Ou seja, parece estar em causa, de forma legítima e ponderada, a possibilidade de tolerar a existência de hospitais e clínicas a fornecerem serviços abortivos.

Tenho para mim que admitir uma despenalização sem possibilitar à mulher abortar num estabelecimento de saúde seria liberalizar o abortamento clandestino. Incentivá-lo. Seria oferecer um sinal contraditório à sociedade. Seria criar uma lei penal ambígua, pouco inteligível, de sinais contraditórios, errática. Foi sempre a minha opinião a respeito de soluções semelhantes no âmbito do consumo de droga, mantenho-a aqui.

Mas o meu "sim" é absolutamente rigoroso. Esta opção da mulher deve ser precedida de um período de aconselhamento. Aconselhamento neutro e informado. O abortamento não pode, não deve, ser incentivado. Dir-me-ão que tal proposta não está prevista na pergunta. Não está. Em rigor, não vejo que um Código Penal tenha de prever tal aconselhamento. Na regulamentação da lei, cá estarei para me bater por esse período de aconselhamento. Se, por acaso, a actual maioria parlamentar se abstiver de o fazer, cá estarei para insistir junto das novas maiorias parlamentares para que o façam.

Se aceito que esta prática seja feita no Serviço Nacional de Saúde? Não. Não aceito. E sei que isso me afasta de muitos dos defensores do "sim". Acontece que esta matéria não está a ser referendada. Não é isso que me está a ser perguntado. Não sou ingénuo. Sinto que o PS, como partido socialista que é, se apressará, num erro gigantesco, a integrar o abortamento no SNS. Cá estarei, para me opor a isso. Um dia, a maioria parlamentar mudará. Espero pela coragem política dessa nova maioria para resolver o problema.

Nenhuma destas objecções que apresento sai, por isso, prejudicada no meu voto "sim". E se votar "não sob condição"? Quem pode, com rigor e acerto, determinar que os votos "não" são todos votos "não sob condição"? Não pode. Não podendo, o voto "não" é isso mesmo, "não".

Voto, por isso, "sim". Uns dir-me-ão que vou ao engano, que vou pelo lado errado. Respeito essas opiniões. Mas não vejo, de verdade que não, quaisquer lados nesta questão. Vejo duas formas de encarar um problema e duas formas de lhe dar solução. Não vejo bons, nem maus. Nem esquerda, nem direita. Nem sequer, pasme-se, civilização e barbárie.

Voto "sim" em consciência, sem olhar para o lado para saber quem vota comigo, como sempre fiz. Voto "sim" na plena convicção de que a actual situação, a actual lei, não protege nem tutela os bens em causa. Voto "sim" porque penso "sim". Chame-se isso o que se chamar.

Publicado também em http://www.aartedafuga.blogspot.com



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Razões liberais pelo SIM

«Se pudesse votar depois de amanhã (...), fá-lo-ia no " sim" por uma razão simples: a liberal. Que faz o Estado entre uma mãe e a sua gravidez? Entre uma mãe, um pai e os seus filhos? Que faria eu, votando "não", entre todas essas mães e todas essas famílias? Que tenho a ver com a matéria? Que direito posso ter de decidir sobre assuntos tão de amor e de ódio, privados e interditos como talvez nenhuma outra coisa? (...) O Estado, de mim ao Presidente da República, tem, do meu ponto de vista, de se afastar daqui, desta zona íntima. Há fitas a circundá-lo avisando: "entrada proibida a pessoas estranhas ao serviço" . (...) Quando defendemos a vida como valor absoluto e intocável, esquecemo-nos de que o simples estar vivo pode ser uma condenação. Trocaria, todos os dias, esse direito à vida puro e simples pelo da dignidade. Uma criança tem o direito de ser sonhada e não, apenas, um imprevisto com que se vai ter de lidar

Alexandre Borges, no 31 da Armada.

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Ciência, convicções, fraude e a dor fetal

A não perder esta declaração de Jorge Sequeiros, Médico Geneticista, Professor Catedrático ICBAS e IBMC (UP). Presidente do Colégio de Genética Médica (Ordem dos Médicos); Membro do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida e Mandatário do MPE.

«Em artigos publicados em revistas científicas (e não meras opiniões não fundamentadas, em debates televisivos), alguns têm defendido que o feto nunca sente dor. Nunca, até ao fim da gravidez. Muito provavelmente, isto não é verdade. Não é crível que assim seja. Às 24 semanas estão já estabelecidas as ligações entre o tálamo e o córtex que permitirão ao feto estabelecer contacto com o mundo exterior e sentir. Todas as mães (e muitos pais) sabem que o seu feto (bebé, criança é só quando nasce!) reage a estímulos nos últimos 3 meses da gravidez. Reage com movimentos ("pontapés") a carícias dos pais, tranquiliza-se com a voz de ambos, com música agradável.


Os receptores nervosos começam a formar-se logo entre as 8 e as 15 semanas, mas são como tomadas sem corrente num edifício em construção; a electricidade só é ligada quando passa ser habitado. Ou seja, depois das 24 semanas. Muito provavelmente só às 30, quando a EEG mostra que o feto já consegue estar "acordado".

A evidência científica actual é a de que a dor implica percepção e consciência do estímulo doloroso. A dor é uma experiência emocional e psicológica, resultado de activação cortical. A reacção a estímulos externos, às 8 semanas, é um reflexo primitivo, que pode existir com estímulos não dolorosos. Como a nossa perna salta quando o martelo bate no joelho. É resultado de um curto-circuito entre receptores e músculos, através da medula espinal, sem passar pelo cérebro. Sem vontade e sem consciência. Sem dor.

O feto de 10 semanas não tem dor, não tem vontade, não tem vigília, não tem consciência. As primeiras ligações ao córtex cerebral em formação, acontecem entre as 23 e as 30 semanas. Mas anatomia é diferente de função. A evidência mais precoce de actividade cortical é entre as 29 e as 30 semanas.

Numa área cientificamente controversa, em pleno calor de uma campanha, afirmações não comprovadas (pseudo-científicas) são tudo menos honestas e responsáveis. Não há argumentos científicos neutrais. O que há são dados científicas, que passam o rigor da comprovação, da revisão por pares antes da aceitação por revistas internacionais. E mesmo estes estão sujeitos a um escrutínio permanente por parte de novos estudos.

A Organização Mundial de Saúde aconselha mesmo que se não deve dar anestesia ao feto antes do 3º trimestre para cirurgia ou abortamento. Por não estar provado que o feto sinta dor nos seis primeiros meses (muito pelo contrário) e pelos riscos aumentados para a grávida. As afirmações em sentido contrário ao estado actual dos conhecimentos, são apenas poeira lançada aos olhos de quem já não quer ver. São convicções e crenças de quem toma partido.

Provada, essa sim, está a dor das mulheres que sofrem as complicações de saúde e as consequências legais dos abortamentos clandestinos. E há que tentar acabar com ela, como tem vindo a suceder em tantos outros países.

Aos dogmas o "não" acrescentou a fraude e a argumentação pseudo-científica. O papel da ciência é fazer perguntas e pôr dogmas em causa, desconstruir mitos e crenças e fortalecer as nossas convicções.

Pela minha parte, estou cada vez mais convicto. Por isso só poderei votar SIM.»

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"A trapaça", por Vital Moreira

«A tentativa de última hora de alguns adversários da despenalização do aborto de lançar a confusão no referendo, com base numa sugestão de não julgamento dos crimes de aborto ("despenalização" sem descriminalização), não só não teve o sucesso desejado pelos seus congeminadores (a julgar pelas sondagens de opinião mais recentes) como se traduziu num evidente descrédito das posições e argumentos do não.
Pois se, afinal, os adversários da despenalização abdicam da ameaça de punição das mulheres que abortem, onde fica a intransigente "defesa da vida", na qual basearam todo o seu discurso moral contra a despenalização? E onde fica o argumento anterior de que a despenalização eliminaria qualquer limitação ao aborto?
»

Ler, ainda, "A trapaça (2)" e
"Despenalização com legalização e regulação não é liberalização", todos de Vital Moreira, no Causa Nossa.

as notícias sobre esta morte não foram exageradas

o mau gosto devia ter limites. não tem. a última mostra disso surgiu em reacções à reportagem da revista visão sobre as mortes de mulheres por aborto clandestino em portugal. houve quem dissesse que uma das mulheres mencionadas, maria ester, da zona de viseu ( cuja história já fora contada no dn), não teria morrido de aborto porque esse nexo causal não foi judicialmente estabelecido no processo contra a 'curiosa' que operou o desmancho.

extraordinário.

extraordinárias também foram as reacções a uma crónica que escrevi no dn sobre a morte de uma adolescente de 14 anos , em 2005, em santa maria. houve quem dissesse que era 'mais' uma história inventada por mim para esta campanha. há decerto quem avalie os outros pelos parâmetros por que se rege: de quem inventa estatísticas de aumentos 'exponenciais' de abortos 'em todos os países onde ele foi despenalizado', acusações de invenção são de facto expectáveis.

podem pois agora fazer o favor de acusar os médicos alexandra henriques, alexandre v. lourenço, ana ribeirinho, helena freitas e luís mendes graça de terem inventado essa tão encantadora história e de a terem publicado, sob o título maternal death realated to misoprostol overdose, numa revista científica americana, a prestigiada obstetrics & gynecology, no número de fevereiro de 2007 (fizeram de propósito para estar disponível na altura do referendo, só pode).

a nossa menina passou assim a ser o caso de mais elevada sobredosagem de cytotec para efeitos abortivos da literatura científica. um recorde, com 60 comprimidos -- uma embalagem inteira tomada ao longo de dois dias.

o artigo não diz quanto tempo levou ela para chegar ao hospital, nem de quantas semanas de gravidez estava.

diz que morreu, e de quê. não diz quanto tempo levou a morrer nem se percebeu que ia morrer. não é um romance, nem sequer uma reportagem. é um artigo científico.


um excerto:

'besides vaginal bleeding she developed severe upper gastrointestinal bleeding and had cardiac arrest just after hospital admission. (...) the patient had multiorgan failure: renal failure, heart failure due to diastolic dysfunction, respiratory failure, and hepatic failure. (...) the peritoneal cavity was filled with abundant serohematic, purulent, fetid fluid. an extensive necrosis of the gastric lesser curvature and distal esophagus was found. after several episodes of cardiac arrest, and despite active ressuscitation efforts, the patient died. '

note-se que esta morte, ocorrida em 2005 e em relação à qual, segundo soube pelo próprio luís graça, corre um inquérito judicial, não foi noticiada até agora. o que, obviamente, significa que outras mortes podem ter ocorrido sem que tenha havida nota pública do facto.

por fim, para quem duvidasse ainda, aí está, preto no branco: ainda há mulheres a morrer de aborto em portugal. em 2005. agora.

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A Sacralização do Genoma

Um cariótipo é uma montagem fotográfica obtida por microscopia óptica em que os cromossomas são representados aos pares, isto é, o cromossoma do pai emparelhado com o cromossoma da mãe para cada um dos 23 pares (no caso do genoma humano). Se fizermos um zoom imaginário sobre um dos cromossomas, chegamos à informação contida no ácido desoxirribonucleico, o famoso ADN. O ADN é uma molécula feita com os mesmos elementos da tabela periódica que formam tudo o resto, dos automóveis aos meteoritos. Nesse sentido, nada tem de extraordinário. Mas o ADN consegue replicar-se (num contexto celular) e está desenhado para armazenar informação, que (ainda num contexto celular) é lida e traduzida. Estas duas características justificam a metáfora algo estafada: o ADN é o software da vida (em rigor, apenas o seu suporte) e o desenvolvimento embrionário um processo de interpretação das instruções nele contidas. Trata-se de uma molécula absolutamente fascinante, mesmo para quem está habituado a vê-la como uma medusa numa solução de álcool etílico, a ler genes todos os dias ou a usar o código genético para escrever novas moléculas.

Com a descoberta da sua estrutura, em 1953, o ADN passou imediatamente a ícone. Conta-se que Francis Crick, ainda sob efeito do eureka recente, terá dito ao entrar num pub: "We have discovered the secret of life!" O entusiasmo não esmoreceu nos 50 anos seguintes; Francis Collins, um dos responsáveis pelo projecto de sequenciação do genoma, olha para o código genético como a linguagem de Deus. Antes era a matemática, agora o ADN. Deus é bilingue.

Esta sacralização do genoma tem sido ouvida repetidas vezes nas últimas semanas pelas vozes do Dr. Daniel Serrão e do Dr. Gentil Martins. Ambos são médicos mas soam a pregadores. Eles e muitos outros atribuem ao genoma uma dimensão profética, única e irrepetível. A dimensão profética não tem substância de facto, é um artifício de interpretação. As duas outras dimensões, pelo contrário, são erros factuais.

Quando o genoma ganha ares de Escritura Sagrada que encerra uma profecia, cada um de nós passa a Messias em versão do it your self. Puxo pela caricatura para revelar o absurdo. Numa tradução secular, o ADN simboliza apenas a possibilidade de futuro que se compromete com a IVG, mas o conhecimento do genoma não altera em nada essa noção de perda. Nenhuma mulher decide melhor se lhe lermos ao serão um livro de texto de biologia molecular.

Quanto à dimensão única, é verdade que com a fusão dos gâmetas se forma uma célula que tem hipóteses de se transformar num indivíduo, algo que nem o espermatozóide nem o oócito podem ambicionar. Nesse sentido, a fecundação tem uma dimensão fundadora e é estúpido dizer-se que o ovo (ou zigoto) vale tanto como um espermatozóide. O ovo vale mais. Por outro lado, a aplicar um critério estritamente genético o espermatozóide e o oócito são tão únicos como o ovo, porque cada um resulta de um processo (a meiose) que baralha a informação genética do indivíduo, isto é, cada gâmeta é já geneticamente único, com um genoma distinto de outros gâmetas e distinto do de todas as outras células do indivíduo. Mas mesmo que assim não fosse, ficaria ainda por explicar a obsessão com a diversidade genética destes ecologistas radicais, que só em vésperas de referendo parecem sofrer horrores com a extinção das ditas entidades únicas.

Sobra o carácter irrepetível do ovo, que é desmentido pela biologia e pelas promessas (e os temores) da biotecnologia. Os gémeos verdadeiros surgem a partir de um único ovo, que numa fase posterior se "repete", isto é, que é capaz de formar duas cópias geneticamente idênticas após um único evento de fecundação. Também as perspectivas de clonagem esvaziam esta noção de irrepetibilidade. Curiosamente, a ilusão de imortalidade despertada pelas técnicas de clonagem é o equivalente, no outro extremo do arco da vida, do fervor com que se olha para o genoma do ovo. Um fervor bacoco, que quer reduzir a nossa existência à bioquímica e com isso dar uma roupagem científica a posições que na verdade são moldadas por outras fontes.

A descoberta do ADN e a sequenciação do genoma nada trouxeram de novo a este debate. Temos uma questão política para resolver, que na base assenta numa discussão ética. Deixemos os cromossomas de fora.

Imagem: cariótipo de um indivíduo com trissomia 21.

PS. Este foi o meu último post no Sim-Referendo. Agradeço ao Daniel Oliveira o convite para aqui escrever, a todos os outros bloggers pelos bons momentos que passámos e aos três ou quatro visitantes que me foram lendo ao longo destes dias.

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Palavras (quase) finais

Desde o início da minha participação neste blog que venho defendendo que o aborto é, usando a palavra da moda, transversal social, cultural e economicamente. Não escondo, nem nunca escondi, que toda esta luta me faz sentido ligada às expressões "maternidade/paternidade consciente" e "direito à escolha". Não posso, contudo, deixar de dizer que quem mais é lesado pela existência desta lei anacrónica e injusta são as mulheres de mais fracos recursos económicos e as mais jovens. Para elas o aborto é, não tão raras vezes como isso, um caso de vida ou morte . Vamos mudar isto, sim?


(fonte da imagem: conferência de Elisabeth Aubény em Lisboa a 17 de Dezembro de 2006)

O voto no Sim, um voto "católico"

O título pode incomodar, mas inspira-se na última catequese do cardeal-patriarca de Lisboa, que veio afirmar ser o voto no referendo sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez uma decisão pessoal e da consciência de cada um... para a seguir definir que "a consciência de cada um" é apenas orientada pelos sectores da Igreja, que votam não e quase demonizam quem vota sim.
Nesta questão, disse D. José Policarpo, "nenhuma decisão humana contra a vida é legítima e honesta". Volto a afirmar: eu não voto contra a vida. Entendo que o meu voto consciente é, antes de mais, de alguém que vê na despenalização aquilo que o actual quadro legal, suportado pela vitória do Não, em 1998, não resolveu: a necessidade de conferir absoluta prioridade ao combate contra o aborto clandestino e liberalizado, que actualmente mata neste país. Criando um quadro legislativo em que se despenalize este acto até às dez semanas em estabelecimento autorizado. Estamos assim, a propor às mulheres (e aos homens, que responsavelmente as acompanhem) que possam decidir conscientemente aquilo que no seu íntimo é doloroso e complexo, sem que a pena recaia mais sobre elas.
A despenalização é também o quadro que permitirá um outro acompanhamento clínico dessas mulheres. Dizer Não é manter o que está. "Quanto mais grave é a questão, maior é a responsabilidade da consciência", diz-nos o cardeal-patriarca. Também acho e, porque levo isso totalmente a sério, voto para que as mulheres decidam sempre em consciência. A consciência não se forma a partir da punição ou da ostracização pública. À Igreja cabe um discurso que seja de compaixão. É esse o discurso que muda as vidas, as vidas de todos.

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Vital Moreira desmonta os pretextos de última hora do "não"

Julgo especialmente oportuna a seguinte explicação de Vital Moreira sobre o que se irá passar após a votação de Domingo, especialmente depois de alguns esforços desesperados de alguns "nãozistas" em tentarem transformar o "Não" num híbrido e falacioso " vote não porque sim, logo se verá". Esvaziando, levianamente, o instituto do Referendo e contrariando a Constituição:

« Qual é o efeito jurídico e político do referendo?

1. Ganhando o sim, o legislador parlamentar fica obrigado ou autorizado (conforme o referendo seja vinculativo ou não) a legislar no sentido proposto , ou seja, despenalizando o aborto, mediante a alteração do Código Penal, no prazo de 90 dias.
Caso vença o não, parece evidente que os votantes recusam a despenalização, ou seja, rejeitam pelo menos que o aborto deixe de ser penalmente punido . Pode eventualmente alterar-se a moldura penal, por exemplo reduzindo a pena prevista para o crime, mas mesmo aí pode entender-se que isso defrauda a vontade daqueles que votaram contra a despenalização justamente por apoiarem a punição que está em vigor. Seja como for, não se pode eliminar a punição penal nem adoptar uma medida de efeito equivalente, pois tal seria desrespeitar a vontade expressa no referendo.
Por isso, não faz o mínimo sentido político nem constitucional o apelo ao voto contra a despenalização do aborto para depois fazer o contrário, como sucede com a proposta feita à última da hora por alguns movimentos e personalidades antidespenalização, através de uma solução legislativa destinada a "despenalizar" na prática o aborto, afastando à partida qualquer punição, ainda que mantendo o crime no Código Penal ("despenalização" sem descriminalização)!
O essencial na pergunta do referendo é a despenalização, e não as suas circunstâncias adjectivas. Logo, se o não vencesse, não se poderia depois tentar conseguir um resultado similar, embora de diferente maneira.


2. É evidente que, se o referendo não for vinculativo, por falta de quórum, o legislador não fica juridicamente limitado nos seus poderes de decisão, podendo alterar, acto contínuo, o regime penal do aborto como desejar (incluindo, mesmo, implementar a despenalização derrotada no referendo...). E a mesma liberdade existe mesmo em caso de referendo vinculativo, quando se esgotar a sua força vinculativa, pois esta só perdura até ao fim da legislatura em que ocorre o referendo. No caso concreto, até às eleições de 2009. Depois disso, o legislador recupera formalmente a sua inteira liberdade decisória, independentemente do resultado do referendo.
Porém, sob o ponto de vista da legitimidade política, mesmo que o referendo não seja vinculativo, parece evidente que, caso triunfasse o não, não haveria autoridade política (muito menos por parte dos que se opuseram à despenalização) para proceder a uma despenalização do aborto, ainda que só de facto, pelo menos durante um período equivalente ao da duração da força vinculativa do referendo, se a tivesse. Não seria ilícito fazê-lo, mas seria bem pouco democrático, além de defraudador das expectativas de muitos votantes.
Como é lógico, quem vota contra a despenalização não pode pretender... a despenalização. Por conseguinte, só uma vitória do sim no referendo pode assegurar a despenalização do aborto.

3. De resto, independentemente do referendo, não se afigura compatível com o Estado de Direito afastar em termos gerais e abstractos a punição de um facto punível como crime, o que seria uma espécie de amnistia antecipada. Na verdade, há aí uma contradição nos termos, um verdadeiro contra-senso. Não se pode renunciar antecipadamente a punir um tipo de crime. O direito penal existe para punir os casos de ilícito criminal. Se há crime, pune-se; se não se quer punir, só resta a despenalização propriamente dita, ou seja, a descriminalização.

Vital Moreira, Causa Nossa.

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Um compromisso, não uma adesão

Contributo de Pedro Lomba
para o blogue Sim no Referendo.

Desde o início da campanha do referendo que tenho tratado com prudência e relutância a questão do aborto. Mas tenciono votar Sim e quero, evidentemente, que o Sim ganhe. Com a campanha a terminar, gostava de deixar aqui algumas notas finais sobre o sentido do meu voto. Não escondo que elas foram provocadas pelo texto do Pedro Mexia publicado no Blogue do Não, porque encontrei nesse texto uma boa formulação das razões que levam o Pedro e outros partidários do Não (os que acreditam, claro, em compromissos) a dizerem não à pergunta em referendo e a defenderem um tipo de compromisso diferente. O excerto mais importante do texto do Pedro é o seguinte: "Se a lei criminal deve (e acho que deve) reflectir os valores dominantes da sociedade que regula, então ela tem de reflectir de algum modo essa contradição. Ou seja: declarar que o aborto é ilegal (excepto nos casos mais chocantes), exactamente porque é um mal; mas não decretar uma punição das mulheres (excepto em casos chocantes), precisamente porque as mulheres recorrem ao aborto em estado de necessidade. Esta contradição, repito, existe na sociedade."


1. Vamos partir desta ideia de que há uma realidade sociológica maioritária que considera o aborto um mal e recusa ao mesmo tempo o julgamento e a condenação das mulheres que abortem. A minha primeira observação é que eu não vejo que esta contradição sociológica justifique a manutenção de uma norma penal incriminadora como a que existe no aborto. Que o aborto é eticamente reprovável em muitas situações, sem dúvida; que tenha de ser punido em todas as circunstâncias (excluindo as situações previstas na lei), através de uma norma penal, não me parece. Devo confessar que não sou penalista, mas creio que uma lei penal não deve assentar em contradições sociológicas mas num consenso social claro sobre a penalização. Na questão do aborto eu não encontro esse consenso (e encontro-o em todos os crimes que agora me ocorrem). O que encontro é uma contradição na sociedade que espelha o carácter altamente controverso do problema. Por isso, embora perceba perfeitamente o que o Pedro quer dizer quando refere que "a lei criminal deve reflectir os valores dominantes da sociedade que regula", eu diria que a moralidade dominante nesta matéria é, por assim dizer, tendencialmente clara em termos éticos mas seguramente indecisa em termos penais. Neste contexto, não creio que o Estado possa manter aqui uma norma incriminadora sem a ponderar ao mesmo tempo, em certa medida, com a decisão da mulher.

2. Em segundo lugar, também me parece que, se existe uma contradição na sociedade entre as pessoas que pensam que o aborto é um mal mas não pretendem a punição das mulheres, essa não é a única contradição. Na verdade, há uma lei penal, que quase toda a gente não quer aplicar, que pretende sancionar as mulheres que abortem, e há um número impressionante de mulheres que estão dispostas, por causa dessa lei, a pôr em risco a sua vida e a saúde pessoal recorrendo ao aborto clandestino. Esta contradição também existe na sociedade. E é uma contradição entre uma lei que ninguém quer aplicar e os efeitos socialmente nocivos que essa lei produz. Creio que nenhuma outra lei penal provoca este género de consequências. De um ponto de vista ético, também me parece censurável.

3. De qualquer forma, admito que ainda se diga que a contradição existente na sociedade não é suficiente para justificar a legalização do aborto até às 10 semanas. É aqui que os campos se dividem e se têm dividido nesta campanha. Os partidários do Não podem defender soluções jurídicas compromissórias para afastar, em certas situações, a condenação das mulheres que abortem. No entanto, parece-me que aquilo que procuramos é um compromisso que traduza aquela realidade contraditória e estabeleça uma ponderação mínima entre a liberdade informada de decisão da mulher e a vida em formação do feto. Na medida em que recusam em absoluto essa ponderação, o que quase todos os defensores do Não nos propõem não é um verdadeiro compromisso entre valores e perspectivas distintas, ou seja, entre a incriminação e a liberdade. Propõem-nos, sim, um compromisso apenas com os seus valores, um compromisso apenas dentro do princípio de que a criminalização tem de continuar a existir, não sendo possível tornar o aborto legal, sob certas condições, para além das que actualmente estão previstas na lei. Se a descriminalização se destina (também) a erradicar o aborto clandestino, os defensores do Não não estão, de facto, a propor um verdadeiro compromisso com os defensores do Sim; estão a propor uma adesão às suas convicções penais ligeiramente modificadas.

4. Finalmente, gostava de fazer uma referência à questão jurídica. Vital Moreira já escreveu aqui sobre o assunto. O referendo vinculativo gera, como é sabido, um dever de legislar ou de não legislar. Se ganhar o Sim, o legislador é obrigado a despenalizar o aborto até às 10 semanas; se ganhar o Não, o legislador está proibido de fazer essa despenalização. O problema das perguntas amplas como aquela que foi posta a referendo é que os efeitos jurídicos que resultam dessas perguntas também acabam por ser amplos. Se o Sim vencer com um resultado vinculativo, não pode obrigatoriamente haver crime para o aborto até às 10 semanas realizado num estabelecimento de saúde legalmente autorizado. Se o Não vencer com um resultado vinculativo, o legislador fica impedido de eliminar a norma penal incriminadora durante qualquer período da gravidez, isto é, fica impedido de proceder à despenalização.

Não quer isto dizer que o legislador não tenha uma certa margem de discricionariedade na definição da solução legislativa que vier a ser adoptada. Por isso, no caso de o Sim ganhar, a futura introdução de um mecanismo de aconselhamento prévio não é contrária ao comando referendário. Também a diminuição da moldura penal, caso o Não ganhe, me parece possível. Já a criação de soluções como a suspensão provisória dos processos ou a previsão de outras causas de exclusão do ilícito são francamente discutíveis por traduzirem uma eliminação, em abstracto e independentemente de qualquer valoração concreta do facto ilícito, da punibilidade penal. Aceito que a questão seja discutível. Mas o que me parece claro é que a única forma de o referendo conduzir, sem discussão, à despenalização é uma vitória do Sim. Os partidários do Não podem prometer-nos muitas soluções alternativas e sei que muitos estão fazê-lo revelando um espírito de moderação e compromisso que me parece salutar. Mas o que, acima de tudo, nos estão a prometer é uma nuvem jurídica de interpretações admissíveis ou inadmissíveis de um resultado referendário. Se o Não ganhar, não teremos a despenalização do aborto, vamos ter a manutenção da situação existente ou, ao invés, uma querela jurídica. Por mim, dispenso as duas coisas e voto Sim.

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As razões do meu Sim

José Mattoso.jpContributo de José Mattoso
para o blogue Sim no Referendo.

Compreende-se que a Igreja Católica condene, em princípio, a Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG). Se há uma certa sacralidade no processo da multiplicação da vida, é preciso respeitá-la. Mas condenar a IVG em qualquer circunstância e seja por que motivo for corresponde a subordinar o homem ao sábado, e não o sábado ao homem. Os padres e bispos que o fazem correm o risco de se parecer demasiado com aqueles de quem Jesus dizia:«Atam fardos pesados e insuportáveis e colocam-nos aos ombros dos outros, mas eles não põem nem um dedo para os aliviar» ( Mt.23.4). Em vez de se obcecarem na condenação seria melhor preocuparem-se com a misericórdia.

A maioria das religiões condena também o aborto, mas admite circunstâncias que o legitimam. Na verdade, a sabedoria tradicional e o bom senso sempre distinguiram entre a norma e a prática. Se procuramos orientações evangélicas para a aplicação da norma, teremos sempre de evitar considerá-la como um absoluto. Temos de aceitar a responsabilidade de decidir em que casos se pode ou deve infringir.

Numa sociedade pluriforme, baseada na convivência de várias religiões, o Estado não se pode constituir como suporte de nenhuma delas nem como guardião dos seus códigos morais. Não pode resolver pela força o que a Igreja não consegue pela persuasão e muito menos perseguir as vítimas de uma sociedade permissiva em matéria sexual e que tanto legaliza a coabitação instável como a família estável. O que é preciso é que Igreja e Estado colaborem, cada qual à sua maneira, na reparação dos inevitáveis estragos causados pela evolução dos costumes. A criminalização por via civil não resolve coisa alguma.

A hierarquia católica, depois de ter parecido querer evitar uma posição agressiva, tem dirigido a campanha como se de uma cruzada se tratasse. Concentrou a sua estratégia na obtenção do «não»; pouco ou nada faz para resolver os problemas que conduzem à multiplicação da IVG. Se conseguir o triunfo do «não», ficará, decerto, de consciência tranquila. Triunfará o «princípio». As mulheres continuarão a abortar, mas a Igreja já não tem se de preocupar com isso. A responsabilidade é delas. A isto chama-se hipocrisia.

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Verdade e mentira dos números

Evolução do número de Interrupções Voluntárias da Gravidez (IVG) na Europa

A Campanha do Não diz que o aumento do número de IVGs demonstra a:
"Relação entre o número de abortos e a alteração do quadro legal".
Mas
não há qualquer relação entre esta evolução e a alteração do quadro legal como o "Não" pretende fazer crer.

Os números não comparam a situação antes e depois da despenalização da IVG:
eles reflectem alterações demográficas, de fluxos migratórios, para além de alterações comportamentais, sociais, económicas, etc., ao longo do tempo.

A Campanha do Não diz que os registos de IVG mostram o:
"Aumento generalizado do número de abortos após liberalização".
Mas
os dados demonstram o oposto.

A Campanha do Não diz que utilizou "fontes dos relatórios internacionais"
Mas
na verdade, o que esses relatórios nos indicam é a TAXA DE IVGs, isto é, o número total de IVGs praticadas em relação ao total das mulheres em idade fértil...

Como se pode ver no quadro seguinte:



Mas também a análise em valores absolutos contraria as afirmações do "Não"…

Alguns exemplos da manipulação de números da campanha do Não:

Finlândia: o gráfico do Não parte do valor 9200 em vez de ser do zero



Suécia: o gráfico do Não parte do valor 31000 em vez de ser do zero

Dinamarca: Há uma redução continuada do número de IVG's desde o início da
década de 70


Reino Unido: há um crescimento nos primeiros anos da legalização, mas depois os valores mantêm-se relativamente estáveis


Estados Unidos: há um decréscimo a partir dos anos 80, nos estados onde o aborto foi liberalizado, tanto em números absolutos como na taxa de IVG



Os bons exemplos que a campanha do Não esqueceu:






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"Eu acredito nas mulheres portuguesas, eu confio nas mulheres portuguesas e no seu sentido de responsabilidade pelo que não consigo ficar indiferente a todos os ataques dizendo que as mulheres não podem tomar sozinhas uma decisão que é sua, e que ninguém pode tomar por elas. (...) Nenhuma lei poderá alguma vez obrigar uma mulher a ser mãe contra a sua vontade. O que a lei deve fazer é promover uma escolha responsável e apoiar as mulheres nas suas decisões, quaisquer que elas sejam.(...) Eu voto SIM." Joana Seixas, Jovens Pelo Sim.

A carta furada

A campanha do não foi muito profissional (demasiadamente?). Notava-se em tudo: na coexistência de vários níveis de campanha – uma urbana, com convidados escolhidos a dedo para os programas televisivos e com outdoors eficazes e uma outra, para os meios mais rurais, do tipo grass-root; na coerência da mensagem; nos instrumentos de propaganda; na influência da agenda dos media (maxime o segundo round do prós e contras). Mas, precisamente por força do profissionalismo, não houve maior sintoma de desnorte do que a introdução apressada nos últimos dias da variante, "não que afinal quer dizer sim". Não foi nem acaso, nem flexibilidade táctica, foi apenas o reconhecimento dos limites da estratégia antes definida. Acontece que inversões de campanha, à última hora, raramente dão bons resultados. Pelo contrário.

Descer mais baixo é impossível

Na campanha feita pelas facções mais radicais do Não, vimos de tudo: a carta intra-uterina à mãe, as lágrimas de Nossa Senhora, o regresso do Zézinho, os panfletos com fetos de três meses estraçalhados e as teses revolucionárias (embora empíricas) segundo as quais os embriões já sentiriam dor às nove semanas. Mas o mais baixo, no sentido literal, a que eles chegaram está nas escadas da estação de metro da Rotunda, em Lisboa. Os transeuntes são obrigados a pisar as seguintes frases, grafitadas a vermelho e negro: "Ajudem-me, por favor"; "Tenho dez semanas"; "Não me pisem". Parece mentira mas é verdade. Entre as frases, pequenas manchas a imitar sangue.

Coisas Simples

Já andava meio frustrado por não deparar com um dos argumentos da vox pop "Não", mas eis que sobre o apito final o descubro no sempre útil Blogue do Não. O argumento é mais ou menos assim:não conheço nenhuma mulher arrependida de não ter abortado. Eu, sinceramente, também não. O problema é que partimos de uma afirmação falaciosa, que só teria valor se o aborto não existisse como opção. Este reparo faz alguma confusão ao "Não", porque para eles a proibição do aborto tem profundas implicações psicológicas, isto é, o "Não" raciocina como se a proibição erradicasse o aborto. Sucede que o aborto existe e, existindo, não podemos excluir que a razão de não se conhecer nenhuma mulher arrependida de ter continuado a gravidez seja justamente a opção do aborto, que evitou o aparecimento de mulheres frustradas por não terem abortado. Sim?

Esclarecido o absurdo da afirmação, podemos ainda atacar - mas agora já só por desporto - as suas bases empíricas. Eu não conheço nenhuma mulher arrependida de não ter abortado e o Pedro Geada também não. É esta a evidência. A nós juntam-se alguns leitores - " tem graça, eu também não". Muito bem. Uma dúvida: em que circunstâncias esperaríamos conhecer uma não-abortista frustrada? Será manipulação admitir que talvez haja uma inibição natural em fazer tal desabafo? E será politicamente incorrecto sugerir que certos meios sociais onde porventura nem o Geada nem eu circulamos se prestam mais a esse tipo de cenários? É que de outra forma não se explica a existência de tantos estudos sobre crianças não desejadas (é só pesquisar na net). Encontrei até um trabalho que chega a conclusões interessantes, embora com demasiada engenharia social para a minha camioneta. O estudo parte de uma premissa: o número de crianças disponíveis para a adopção é um indicador do número de crianças não desejadas, pois estas tendem a ficar para adopção a bem (os pais entregam-nas) ou a mal (os assistentes sociais salvam-nas de famílias não-funcionais). Como o número de crianças disponíveis para adopção nos EUA diminuiu com a legalização do aborto, os autores concluem que diminuiu também o número de crianças não desejadas.

Por último, faz ainda sentido olhar pelo outro lado e perguntar o que sentem as mulheres que abortam e se se arrependem de o fazer. Na revista Psicologia Actual (10, Janeiro de 2007) vejo citado um artigo de revisão com os seguintes dados: numa amostra de 292 mulheres (EUA) estudadas duas semanas após a IVG, 76% sentiam-se contentes/felizes e apenas 17% se sentiam culpadas. Quanto a saber se têm um arroubo de consciência mais tardio e ficam com distúrbios psíquicos, a ser verdade e tendo em conta o número de mulheres que abortam, estaríamos na presença de um enorme problema de saúde pública; a revisão da literatura não vai nesse sentido.

Não tenho competência para rever esta literatura, limitei-me a citar exemplos de fontes reputadas com uma leviandade só vista em discussões sobre global warming. Sei que estamos à boca das urnas e saturados desta conversa, mas fica a conclusão algo pífia de que a vox pop diz muitas asneiras.

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Apelo ao absentista

A ti, que estás farto/a desta batalha campal de argumentos, acusações e emoções;
a ti, que achas que este debate não te toca a ti;
a ti, que te ofende o despudor de um assunto íntimo tratado na praça pública;
a ti, que achas que nem sim nem não;
a ti, que ainda estás indeciso/a;
pensa que nesta votação não há meios termos, só há duas opções;
pensa que tens a oportunidade (rara) de participar numa decisão colectiva;
pensa que desta vez não estás a votar naqueles que hão-de decidir (esses não quiseram ou não puderam), mas és tu que vais decidir com o teu voto directo;
não queiras ficar de fora, ou terás depois de carregar o peso da tua indecisão;
pensa que podes contribuir directamente para mudar uma lei iníqua e para poupar sofrimento a muitas mulheres;
pensa que podes ajudar pessoas que estão próximas de ti;
ainda estás tempo de escolher uma sociedade mais justa;
o teu voto conta,
vota SIM.